O homem sonhou, criou asas e aprendeu a voar,
mas outros homens viram, que do alto, melhor poderiam atirar!
Ramsal Limaj
I
Um dia, um moço saiu do Brasil
e por algum tempo, ninguém mais o viu.
O que estaria fazendo aquele brasileiro,
em terras longínquas, no “estrangeiro”?
II
Noutro dia, o moço sumido apareceu
e um grande fato na História ocorreu.
Havia posto em prática sua grande paixão.
E deslumbrou o mundo, pois inventara o avião.
III
De bambús e frágil tecido, em esquisita
armação,
estranha caixa de sapatos, sem tampa e sem junção.
O invento louco, impávido surgia,
para o incrédulo público com ares de ironia.
IV
Duvidaram do invento: Voar aquilo? Não poderia!
Mas o brasileiro, baixo de estatura, mas alto na teimosia,
já subira às nuvens, num dirigível e num
balão.
Insistia, agora, em voar. E provaria à multidão.
V
Falta-lhe a cera! Dizia alguém.
Por que a cera? Perguntaram também.
– Pra derreter ao sol, quando subir,
tal qual a Ícaro ... e pra depois cair.
VI
Imprudente! Como pode chegar a tanto?
Voar? Numa geringonça mais pesada que o ar?
E sorridente, o baixinho no seu canto,
aguardava a hora certa de seu sonho realizar.
VII
Prepara-se a multidão. É grande a expectativa.
Somente queriam rir do iminente fracasso.
Mas irrompe uma ordem em voz ativa,
Afastem-se todos! Liberem o paço!
VIII
E o moço que saiu do Brasil,
Pra aportar em terras do “estrangeiro”,
amaina a sede com água de cantil,
e diz: Voar, de fato, eu serei o primeiro!
IX
E sobe altivo naquela frágil armação,
como a dizer ao mundo que aguarde.
Faz-se o silêncio, ouve apenas seu coração.
A multidão, quieta, interrompera o alarde.
X
Faz uma prece e liga calmo o motor,
que dá um estampido, tosse e expele fumaça.
E fala ao invento, que acaricia e abraça:
Devolve-me, agora, o que te dei de amor.
XI
Há que mostrar ao mundo que seu invento é nobre.
Solta as amarras e aciona o manche, suavemente.
E querendo provar que voa, naquele céu da cor do cobre,
a esquisita armação desgarra-se do chão,
celeremente.
XII
E o 14-Bis alça vôo, deslumbrante, num só impacto,
Cumpre a missão e pousa, como uma águia retornando ao
ninho.
E a multidão, boquiaberta e incrédula: Abra-se o vinho!
O engenho voa, não se negue isso, realmente é um fato!
XIII
O “vôo” com catapulta daqueles irmãos,
a primazia não lhe tira das mãos.
Registre-se o fato, que indelével na memória,
servirá de exemplo para o futuro da história!
XIV
Na terça-feira, 23 de outubro de 1906,
A Praça de Bagatelle apareceu ao mundo,
local do primeiro vôo, de singular altivez,
daquele moço, que um dia sonhou, fecundo.
XV
Quisera mostrar ao povo que é possível sonhar
e com trabalho e vontade, também é possível criar.
Não encerrava alí o seu sonho, advertiu à
Bagatelle,
e pouco tempo depois, retornava com o Demoiselle.
XVI
E o moço no estrangeiro, com tanto esforço sofreu.
Retorna à pátria, ao Brasil. O pássaro retorna ao
ninho.
A saúde se abalou e pela saudade cedeu.
Buscaria junto dos seus o tão esperado carinho.
XVII
Mas o mundo não era só isso. A humanidade aquecia
com as intrigas e a ganância ... e do amor se esquecia.
Iniciou-se uma guerra, imensa e sem fronteira.
Como pode a mente humana aceitar tanta besteira?
XVIII
Para do alto atirar e matarem com mais perfeição,
agiam sem escrúpulos e utilizavam o seu invento.
E o moço altivo e forte, recolhe-se. Decepção.
Sofre mais que qualquer outro. É triste o seu lamento.
XIX
Com os sonhos realizados, os frutos foram colhidos.
Mas deturparam sua invenção. A sina do herói
é inglória.
Pois a mente de uns, com outros sonhos malditos,
mesmo à custa de vidas (milhares), queriam vitória.
XX
O mais pesado que o ar não fora feito pra matar.
Não tivera essa intenção, e só restava
anunciar.
E em julho de 32. No sábado, 23,
o moço de Cabangu virou notícia outra vez.
Para refletir:
20 de julho de 1832
– Nasce Henrique Dumont (o pai)
20 de julho de 1873 – Nasce
Alberto Santos Dumont
20 de julho de 1969 – O
primeiro homem pisa na Lua