"Pessoalmente, eu admirei Santos Dumont, antes de o conhecer em pessoa.
Suas aventuras aéreas eram-me relatadas pelo semanal
francês "Vie au grand-air", quando há meio século
eu trabalhava no sertão africano, como geógrafo.
Notei que ele começara seus estudos pelo princípio,
pelo balão esférico. Seguiu depois com o
dirigível, então só militar, com motor
eléctrico. Foi avançando com sua volta à Torre
Eiffel; daqui passou ao dirigível a "motor de fogo", que
representava o "fogo ao pé da estopa", perigoso, como depois se
viu.
E assim foi levado ao Avião, já sem
hidrogénio, mas que ele viu ser a "máquina de voar" do
futuro. E, enfim - faz agora uns 52 anos - Santos , obteve resultado
material, provando que o "Homem poderia vir a voar", e bem melhor que
os rivais, os pássaros. Parece que alguns estranharam que ele
não tivesse feito tal demonstração na sua terra, o
Brasil, como ouvi há 36 anos, repetir no Rio, causando-lhe
antipatia, indiferença. Mas ainda lá não havia os
recursos para suas experiências com motores leves, de gasolina,
além de pessoal para a construção de
balões, etc.
Porém faltava ainda um interesse mundial, como se provou
com a sua experiência definitiva em 1906, em St. Cloud. Aqui suas
experiências provocaram um interesse público, na
presença de interessados no problema, como Blérist e
outros, que viram materialmente o futuro que S. Dumont revelara
publicamente. E assim, sua experiência logo provocou outros
Pilotos do Ar, que passados poucos meses já sabiam voar, com
recursos derivados dos que revelara o "Pai da Aviação", o
nosso S. Dumont. De sorte que, se outros já tinham voado melhor
que os seus dois heliómetros - vôo que eu gostaria de ver
repetidos todos os anos por esta época o facto concreto é
que foram suas experiências de 1906 o passo capital, que provocou
tal desenvolvimento, como aquele que a Compª. "Panair do Brasil"
demonstra com seus aviões gigantes, que embarcam aos 70
passageiros, todas as semanas !
Não é tudo. Em 1922, S. Dumont ofereceu-me, como ao
seu colega experimentador, aqueles dois instrumentos, com os quais
procurava demonstrar praticamente o poder da orientação
do Avião no Ar - semelhante àquele que - há
séculos - os "Pilotos lusos" revelaram ao Mundo, no alto mar. O
seu Cronómetro aqui está, ao passo que seu sextante, que
serviu também a seus estudos de Navegação,
já o ofereci ao Museu de São Paulo, estudos em que ele
nos precedera.
E, por assim dizer, em réplica, tive ocasião de lhe
proporcionar um grande prazer espiritual: Na tarde de 4 de Junho de
1931, navegava S. Dumont a bordo do paquete Lutetia, levando assim, na
sua última viagem para o Brasil, o Pioneiro do Ar, que era
Santos Dumont; pelo través do paquete, o Avião-gigante
D.O.X., passou-lhe uma centena de metros no mar, voando apenas a uns
seis metros da água. Corríamos à velocidade de cem
nós, com segurança, e proporcionando-lhe a
satisfação de verificar palpavelmente o alcance da sua
criação inicial - voando com aquela máquina cem
vezes mais pesada que a sua "Demoiselle", de Paris. Íamos
confiados em instrumentos, como aqueles que ele experimentara,
Cronómetro e Sextante. Aquele acontecimento aéreo,
mostrava que ele previra tudo, melhor que outros o teriam feito, sem
testemunhas.
Eis o que notei, apenas 25 anos depois do seu vôo
público, definitivo."