EUA recriam vôo que dizem ter sido o primeiro da
história para comemorar centenário de um feito sem
testemunhas.
Catharina Epprecht
Especial para o JB
[18/DEZ/2003]
O centenário da aviação, comemorado ontem nos
EUA, ainda suscita polêmica sobre a paternidade do invento, que o
Brasil e outros países creditam ao mineiro Alberto Santos Dumont
e o seu 14 Bis no histórico vôo de 12 de novembro
de 1906 em Paris. Com presenças ilustres, como Neil Armstrong
(primeiro homem a pisar a lua) e Chuck Yeager (primeiro piloto a
quebrar a barreira do som), o presidente George Bush promoveu, em Kill
Devil Hills, Carolina do Norte, uma solenidade em que o ponto alto
seria o vôo da réplica do protótipo dos Wright, o Flyer.
A festa foi prejudicada pela chuva. Bush fez apenas um discurso
rápido.
- O vôo dos irmãos Wright pertence à toda a
Humanidade, mas eles são típicos americanos - disse o
presidente, acompanhado do ator John Travolta, que também
é piloto.
George Bush e sua comitiva não viram a tentativa de
decolagem do Flyer , transmitida em cadeia nacional. A
réplica, pilotada por um dos construtores, foi lançada na
catapulta, mas não ganhou velocidade acabou atolada na pista. A
explicação oficial culpou o vento, fraco, pelo fiasco.
Os americanos e alguns europeus - a data foi festejada ontem
também na Itália - defendem que Wilbur e Orville Wright
fizeram o Flyer voar em Devil Hill no dia 17 de dezembro de
1903. A divergência em relação a Santos=Dumont se
sustenta na definição de avião e na
divulgação do feito americano.
De acordo com a Federação Internacional de
Aeronáutica (que valida o vôo de Santos=Dumont como o
primeiro) um avião precisa decolar, voar e aterrissar por seus
próprios meios. O Flyer foi impulsionado por uma
catapulta similar à uma besta (lança-flechas).
- Além disso, eles não tiveram testemunhas. E
quiseram vender sua invenção para o Exército sem
mostrar um modelo. O Exército, é lógico,
não aceitou - conta o professor de História da
Mecânica da UFMG Danilo Amaral. Para ele, Santos=Dumont tinha
preocupação humanista, por isso não quis patentear
o 14-Bis. - Todos poderiam copiar. Já os
americanos
estavam preocupados em ganhar dinheiro - diz.
Para o brigadeiro Hugo Piva, especialista em tecnologia
aeroespacial, os irmãos Wright teriam se valido de outros
projetos para, mais tarde, criar e patentear seu invento. - Eles deram
importante contribuição para a aerodinâmica, mas
seu motor não era suficientemente potente para decolar - diz.
Em artigo sobre o centenário na edição de
novembro, a revista Scientific American reconhece o
“caráter secreto” da invenção dos Wright. Apesar
disso, diz que com o 14-Bis, Santos=Dumont fez a “primeira
demonstração pública de vôo” e que “por
falta de provas contrárias naquele tempo” foi tido como primeiro
homem a voar.